segunda-feira, julho 11, 2005

A lenda do "arrastão"

Confesso que acreditei no que vi na televisão, no dia 10 de Junho, na abertura de todos os telejornais. Confesso que aceitei aquilo como uma verdade inquestionável e senti que era grave.
De facto, era grave, gravíssimo! Mas só se soube agora a verdadeira gravidade do problema! O problema não eram os acontecimentos, mas o modo como se divulgaram os acontecimentos. Diana Andringa investigou e deu voz ao Comandante Metropolitano de Lisboa, da PSP, desvendando outra versão dos acontecimentos.
Já há umas semanas, antes de vir a lume esta reportagem, li no Correio do Leitor de um jornal diário uma opinião de um cidadão que, estando presente na praia de Carcavelos na altura do incidente, fez o seguinte relato do sucedido: uma mão cheia de indivíduos levaram, de facto, a cabo uma série de furtos. A grande maioria deles, senão a totalidade, eram pretos. Contudo, é do conhecimento geral que a praia de Carcavelos é bastante frequentada por africanos. Qualquer pessoa que sentisse os seus bens ameaçados durante a confusão, teria o instinto de pegar nos seus pertences e correr para longe! A diferença é que...sendo branco, seria uma vítima dos malfeitores; sendo preto, seria apenas mais um a engrossar a lista de bandidos!
Faz isto lembrar um sketch do Gato Fedorento, em que estão dois réus perante o juiz: um branco e outro preto. O juiz começa a ler a deliberação do colectivo de juízes: não tendo conseguido determinar perante as provas qual dos réus era o culpado decidiu-se que, de acordo com o disposto na lei, em caso de dúvida a culpa deve ser atribuída ao indivíduo de raça negra!
Tal e qual como em Carcavelos! Aplicou-se à letra o provérbio popular que diz: "Preto a correr é ladrão" ... Mesmo que a mochila que leve na mão seja a dele.
Há pouco, na Antena Aberta da Antena1 (fórum de discussão aberta à participação dos ouvintes), ouvi um participante lançar para o ar a seguinte hipótese especulativa: e se, num dia tão emblemático (Dia de Portugal), alguém se lembrasse de pagar a meia dúzia de jovens negros para armarem confusão na praia? Que melhor desculpa se poderia ter depois dessa confusão para organizar uma manifestação de fascistas de extrema direita?
A questão do comportamento da comunicação social perante o dito "arrastão" é que foi completamente degradante!! Começaremos a ter em Portugal televisões tablóides? Que apenas noticia o que de mal acontece e que explora esse mal até à exautão? Sim... infelizmente já temos uma televisão assim - a TVI! O Jornal Nacional é uma lástima, mas o que mais me preocupa é ver que neste país esse é o noticiário mais visto! Algo de muito errado se passa! E mais preocupante é ver toda a comunicação social a ir atrás, por este caminho miserável, que envergonha o jornalismo!
Com que objectivo? Porque é que a televisão - e o jornalismo em particular - cada vez mais se abstém da isenção a que estão eticamente obrigados e insiste em manipular as opiniões das pessoas? Em quem devemos acreditar? Para onde vai este país quando a maior parte da população liga ao que diz a Manuela Moura Guedes? O jornalismo transformou-se numa simples máquina de fazer dinheiro! A qualquer preço! São assim os novos tempos...
Costumo ter algum sentido crítico em relação a alguns comentários ou notícias, mas parto sempre do princípio que os factos que constam das notícias são fidedignos! Mas quando vemos uma maquinação geral da informação, em todos os canais de comunicação, torna-se preocupante começar a sentir dúvidas sobre os factos noticiados!
E se os incêndios forem provocados por jornalistas à procura de um "furo"? E se as pessoas são pagas para fazer declarações falsas? Quem é que nos protege? Quem é que nos informa? Não quero sequer considerar como possibilidade estas especulações. Mas depois do "arrastão"...quem é que não desconfia?
O "arrastão" não foi em Carcavelos ... foi no país todo! Todos os portugueses foram roubados! Roubaram-lhes a boa fé com que aceitavam as notícias como verdadeiras e isentas!